DICA DE LIVRO – “Guia Afetivo da Periferia” – Marcus Vinicius Faustini

DI DE LIVROS – “Periferia pura”.

Por: Marcus Vinicius Faustini.

A obra: GUIA AFETIVO DA PERIFERIA.

Autor: Marcus Vinicius Faustini.

Caminhando pela Lapa ou pelo Largo da Carioca, não se espante se um homem oferecer um livro como quem vende balas no sinal de trânsito: “Eu podia estar roubando, eu podia… Mas estou apenas oferecendo meu livro. Alguém quer ler?”

O escritor Marcus Vinicius Faustini caminha pelas ruas do Rio de Janeiro, em especial pelo Centro, em busca dos leitores do Guia Afetivo da Periferia, sua estreia na ficção. Ele aborda os pedestres, não importa a profissão ou classe social, estende o livro e puxa a conversa. Qualquer um pode levar o livro para casa e, se gostar, escrever por e-mail o valor que pagará pelo exemplar.

“O livro não pode morrer na livraria, livro é para ser lido. Os artistas, intelectuais orgânicos de periferia, precisam produzir a partir das suas vivências. O livro é uma tentativa de contribuir com a busca de uma estética do território popular. Não faço literatura como forma de iluminação, essa é uma ideia burguesa. O escritor tem de manter contato com sua obra, com os leitores”, defende Faustini, que já ocupou o cargo de Secretário de Cultura de Nova Iguaçu.

A estratégia de divulgação do livro deu certo, Faustini e recebeu o retorno dos leitores, que escrevem sobre a descoberta da leitura ou da experiência relacionada com a cidade através da memória afetiva. O autor compartilha a ideia de popularização da literatura, sem perder a identidade estética.

“É emocionante quando a pessoa escreve dizendo que se identificou com o livro. Não tem preço que pague essa relação. Outro dia, uma professora me escreveu dizendo que indicou o livro para os alunos e pediu que fizessem um ‘guia do bairro’. Imagina o Guia Afetivo de Caxias?! Quero ver a periferia lendo e escrevendo livros”, comemora o autor, que já transformou o livro num projeto, onde jovens de comunidades fariam outros guias afetivos para apresentar seu território:

Marcus Faustini – Foto Vania Laranjeiras

“Esse livro tem despertado o interesse dos jovens, é um projeto estético que trabalha com a descoberta da cidade e da literatura. Minha tentativa é criar uma expressão estética na literatura, não apenas a descrição da sobrevivência. As memórias devem se tornar um instrumento de ação. A ideia é que isso contribua para criar uma nova profissão: o guia afetivo. O livro não pode se tornar apenas um objeto.” diz o escritor, que se formou ator pela Escola Estadual de Teatro Martins Pena, antes de se dedicar à literatura.

O Guia Afetivo da Periferia é um romance, protagonizado por um autor andarilho, que constrói a narrativa através de afetos com o universo ao redor, a cidade. Neste caso, é o Rio de Janeiro da periferia. Um álbum de suas memórias, com retratos de vivências nas ruas, de Santa Cruz a Ipanema.

O narrador passeia pela infância, convidando o leitor a conhecer seu trajeto, nem sempre de fácil travessia. Na caminhada, descobre-se outra periferia – poderia ser também uma cidade de interior – onde mesmo à margem o passante pode estar no centro. Aprende-se a noção de “território” através dos afetos relembrados pelo protagonista: ventilador Faet, balinhas de tamarindo, sacolé, dragão chinês, sardinhas 88, Coca-cola, jabuticaba…

Podemos fazer um paralelo da obra de Faustini com o Guia sentimental do Recife, de Gilberto Freyre; o Guia da cidade de Lisboa, de Fernando Pessoa. E também, com as Memórias sentimentais de João Miramar, de Oswald de Andrade. Além de João do Rio, com a Alma encantadora das ruas. Todos esses autores andam pelas ruas, falam de suas cidades, e fazem da narrativa a referência de uma época.

Na apresentação do livro, entre tantas definições, o sociólogo Luiz Eduardo Soares utilizou a expressão “Fragmentos de um discurso amoroso sobre o Rio de Janeiro” para nomear o livro Guia Afetivo da Periferia. Faz sentido a referência à obra do escritor e semiólogo francês Roland Barthes.

Ficção ou autobiografia?

“Ficção, sem dúvida. Mas lembre-se que a linguagem e vida são uma coisa só”, diz Faustini.

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